16 de abril de 2013

Murilo Mendes- Canção do Exílio



Murilo Mendes, nascido em 1901, na cidade de Juiz de Fora, MG, faleceu em Lisboa, no ano de 1975. Lançou-se no cenário literário do primeiro modernismo brasileiro com o livro POEMAS, que publica poesias compostas entre 1925 e 1929.
É notável a capacidade e a habilidade do poeta para transitar por uma variedade de temas e formas, pondo em prática um tipo de experimentalismo incomum em sua época. Todavia as múltiplas faces de sua obra gravitam em torno de elementos que não se dispersam, assegurando a unidade do conjunto.


CANÇÃO DO EXÍLIO

Minha terra tem macieiras da Califórnia
onde cantam gaturamos de Veneza.
Os poetas da minha terra
são pretos que vivem em torres de ametista,
os sargentos do exército são monistas, cubistas,
os filósofos são polacos vendendo a prestações.
A gente não pode dormir
com os oradores e os pernilongos.
Os sururus em família têm por testemunha a Gioconda.
Eu morro sufocado
em terra estrangeira.
Nossas flores são mais bonitas
nossas frutas mais gostosas
mas custam cem mil réis a dúzia.
Ai quem me dera chupar uma carambola de verdade
e ouvir um sabiá com certidão de idade!

O poema acima está incluído no primeiro livro de Murilo Mendes, publicado na fase mais demolidora do primeiro modernismo brasileiro, cujo ideário inicial está muito bem delineado ao longo dos seus versos. O poema, escrito em versos brancos e livres, realiza uma audaciosa paródia do famoso e celebradíssimo poema “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias, poeta integrado no Romantismo brasileiro.
Gonçalves Dias compõe o seu poema para expressar o seu amor à pátria e a sua saudade do Brasil, quando residia em Portugal. Murilo Mendes opera a desconstrução da mensagem do poeta romântico, desvia-se da retórica própria do Romantismo, abandona o lirismo saudosista do texto original e, lançando mão dos recursos disponibilizados pela “paródia”, organiza a sua versão da “Canção do Exílio” como veículo de uma rigorosa crítica à proliferação de produtos, modismos e hábitos estrangeiros no Brasil.
Compreende-se a revolta do poeta com o culto brasileiro pelos elementos estrangeiros, em detrimento das coisas genuinamente nacionais, justifica-se na medida em que contrariam os postulados do ideário nacionalista defendido pelos modernistas.