12 de agosto de 2011

Sophia de M. B Andresen: As Pessoas Sensíveis.






As pessoas sensíveis não são capazes
De matar galinhas
Porém são capazes
De comer galinhas

O dinheiro cheira a pobre e cheira
À roupa do seu corpo
Aquela roupa
Que depois da chuva secou sobre o corpo
Porque não tinham outra

Porque cheira a pobre e cheira
A roupa
Que depois do suor não foi lavada.
Porque não tinham outra
"Ganharás o pão com o suor do teu rosto"
Assim nos foi imposto

E não: 
"Com o suor dos outros ganharás o pão"
Ó vendilhões do templo
Ó construtores
Das grandes estátuas balofas e pesadas
Ó cheios de devoção e de proveito
Perdoai-lhes Senhor
Porque eles sabem o que fazem

( Sophia de Mello B. Andresen- Livro Sexto (1962)

Nesse poema, Sophia de Mello Breyner Andresen denuncia a opressão com o mesmo ímpeto que execra os opressores e rejeita a hipocrisia dos que exploram o trabalho dos outros e, sem nenhum brio, se mostram pessoas religiosas de grande devoção e fé. A autora denuncia a situação dos explorados que, por não disporem de roupas para trocas, vêem-se forçados a secar a única que possuem no próprio corpo. Tal situação não escapa à crítica e à execração aos inescrupulosos exploradores dos menos favorecidos.
Se o título do poema é irônico, não menos é a primeira estrofe ao abrir o discurso poético com ironia ao se referir à hipocrisia das pessoas que se rotulam como "sensíveis" por não terem coragem para matar galinhas, mas, contraditoriamente, não se recusam a comê-las. Após a ironia crítica inicial, na estrofe que se segue, a autora lança a sua denúncia da exploração dos pobres e miseráveis pelas pessoas “sensíveis”, ávidas por dinheiro. Dinheiro que "cheira a pobre e cheira / À roupa do seu corpo", como enuncia os dois primeiros versos, depois fazendo ecoar a mesma ideia nos versos subseqüentes, reforçando a abjeção do dinheiro mal ganho com o suor alheio, o dinheiro que está impregnado com o odor do sofrimento e da injustiça.
Na terceira estrofe, há uma grande expressividade no recurso à citação bíblica – "Ganharás o pão com o suor do teu rosto" que contrasta com as palavras do verso "Com o suor dos outros ganharás o pão", explicitando a execração à exploração, reforçada pela afirmação da existência de homens que "com o suor dos outros" ganham "o pão". Os mesmos que são rotulados como "verdadeiros vendilhões do templo", como na parábola bíblica. Sophia recorre à imagem farisaica dos "vendilhões do templo”, dos hipócritas de atitudes dúbias, que costumam ir a Igreja, como se fossem bons e justos cristãos, mas, em suas vidas públicas erigem "grandes estátuas balofas e pesadas" e só mostram interesse pelo que possam ganhar à custa do sacrifício dos outros.
Na estrofe final, a autora fecha com chave de ouro o poema, usando a apóstrofe bíblica adaptada à sua crítica condenatória: "Perdoai-lhes Senhor", porque sabem o que fazem”, cuja modificação das palavras de Cristo exprime a veemente ironia que percorre todo o poema.



4 comentários:

Anônimo disse...

Adorei! Linguagem perfeita

Anônimo disse...

adorei, está ótimo, me ajudou muito mesmo!

sou admiradora de todas as pessoas que fazem resumos sobre os poemas de Sophia de Mello Breyner Andresen.

gostaria de conhecer voce pessoalmente, acha que é possivel??

meu telemovel é 966688965

Anônimo disse...

I loved your blog, is fantastic, is very simple, which makes it very correct.

kiss Mary

Anônimo disse...

Zenóbia é um dos melhores blogs sobre a Shopia de Mello Breyner que alguma vez li, muitos parabéns!!
Espero ver mais textos seus, tem muito talento

bjs mafalda