O "Poema de sete faces" faz parte da coletânea poética "Alguma Poesia", de Carlos Drummond de Andrade.
Divulgadíssimo, o texto tornou-se tão consagrado quanto o poema "No meio do caminho", especialmente no ambiente universitário, passando a ser um dos textos mais conhecidos, apreciados e comentados da obra de Carlos Drummond de Andrade.
“Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra disse:
Vai, Carlos!, ser gauche na vida.
As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.
O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus,
pergunta meu coração.
Porém meus olhos não perguntam nada.
O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.
Meu Deus por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.
Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.
Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.”
O conteúdo do poema remete a uma das temáticas fundamentais da obra poética de Drummond: a problemática convivência do homem com o mundo que ele considera absurdo, sem lógica e difícil de ser compreendido. Assim, cada estrofe do poema configura-se como uma face dessa relação problemática entre um eu desajustado (gauche) e a realidade na qual está inserido.
O próprio poeta se apresenta no poema como um ser “gauche”, ou seja: inadaptado em um mundo que lhe é estranho, incompreensível e sem lógica. Por isso, ele opta por um distanciamento dessa realidade, assumindo uma postura de simples observador, que analisa o mundo que o rodeia de forma individualista e pejada de ironia.
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Zenóbia Collares Moreira