22 de março de 2012

Os Cantos do Corpo - Isabel Aragão.


A poesia de Isabel Aragão, poeta portuguesa, inscreve-se na linha do erotismo, desenvolvendo a temática do corpo liberto dos entraves da repressão. Ela segue justamente os que fazem uma literatura transgressiva em relação aos tabus culturais e religiosos que interditam, principalmente, à mulher a expressão da sua sensualidade. Com efeito, Isabel Aragão busca exatamente realizar uma literatura que se erga como um libelo em favor da liberdade de expressão. 
É com a sabedoria da palavra e a sensibilidade do espírito que Isabel Aragão vai em busca “do corpo feminino da poesia”, para usar a expressão de Maria Teresa Horta. No prefácio do livro Cantos do Corpo, esta escritora, comentando a escrita de sua autora, exalta a ousadia com que ela faz a exposição do corpo em seus textos e a habilidade com que deixa a dúvida entre o imaginado e o vivido. 
como remos os braços
projectam atlânticos
na rua íngreme do teu corpo
e há uma charrua no ventre que me despe
nos ermos compactos que crescem
entre as pernas peço-te o mar
numa qualquer ilha de viagens em regresso
quando perto do escuro nascemos

escrevo – a mesa é o teu corpo roçando as palavras – 
as mãos como que a lavarem santuários
no branco sujo dos teus beijos
ouço teus paços plantarem árvores
no azul da chuva e os rios descerem
na luta dos meus braços com as pernas

tenho-te dentro das pernas soltas
escrevo os dias com as pontas dos troncos
morena de pedaços tardios em tuas horas
e quero-te – mergulho de peixe no voar das pedras
quando te faço nas dunas – o corpo do silêncio
o teu corpo emigra no meu

como rios surdos de paisagens
e és cúmplice da carne nua
e as docas enroladas são as margens
de cardumes em viagem contra o cais

Isabel Aragão escreve suas poesias no decorrer de uma perene busca da palavra capaz de dar expressão a um discurso que exprima de maneira exata a linguagem do corpo feminino (corpo roçando as palavras), a linguagem da paixão (quero-te – mergulho de peixe no voar das pedras / quando te faço nas dunas – o corpo de silêncio). Sem sombras de dúvidas, a poeta é dotada de grande talento, de enorme sensibilidade e evidente qualidade de estilo

 

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