3 de setembro de 2011

A agonia da saudade e a angústia da solidão: Luís de Camões.




Nenhum poeta exprimiu de forma tão bela, comovente e dolorosa a agonia da saudade e a angústia da solidão causadas pela perda da mulher amada, arrebatado pela morte, como o fez Camões no soneto que se segue:

O céu, a terra, o vento sossegado...
As ondas, que se estendem pela areia...
Os peixes, que no mar o sono enfreia...
O nocturno silêncio repousado...

O pescador Aónio, que, deitado
Onde co vento a água se meneia,
Chorando, o nome amado em vão nomeia,
Que não pode ser mais que nomeado:

— Ondas – dezia – antes que Amor me mate,
Tornai-me a minha Ninfa, que tão cedo
Me fizestes à morte estar sujeita.

Ninguém lhe fala; o mar de longe bate;
Move-se brandamente o arvoredo;
Leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita

Logo na primeira quadra já se anuncia o clima de tristeza que atravessará o soneto, ao evocar a paisagem litorânea noturna, tranqüila e silenciosa que irá estabelecer uma oposição ao estado de alma do pescador Aónio, imerso em sua dor. Na segunda quadra e no primeiro terceto, este é focalizado a proferir palavras de mágoa, suplicando às ondas o retorno de sua falecida amada.

No último terceto é novamente evocada a placidez da paisagem litorânea, que responde  com a mesma e inalterável serenidade ao sofrimento de Aónio: as ondas do mar quebrando na praia ao longe, o ruído suave do arvoredo e o sopro ameno do vento levando a sua voz, como explicita o último verso (leva-lhe o vento a voz, que ao vento deita).

A ausência da amada, o sentimento de solidão e de abandono adquirem neste contexto um sentido de amargura impotente, pois o pescador sente e percebe que está irremediavelmente sozinho com a sua angústia e com o seu sofrimento, rodeado por uma paisagem absolutamente serena e alheada ao seu mal.
_________________________________
Zenóbia Collares Moreira Cunha


Nenhum comentário: