3 de janeiro de 2012

Poesias de Maria Alberta Rovisco Menéres


Poetisa, ficcionista e tradutora nascida em Vila Nova de Gaia, foi casada com o poeta Ernesto Emmanuel de Mello e Castro, com quem organizou e publicou a Antologia da Poesia Portuguesa –1940-1977. Maria Alberta tem vasta colaboração em jornais e revistas literárias. Foi diretora do Departamento de Programas Infantis e Juvenis da Radio televisão Portuguesa (1975-1986). Além da sua obra poética, escreveu uma considerável quantidade de livros infanto-juvenis. Com o seu livro Água Memória, recebeu o prêmio Giacomo Leopardi, ao qual seguiram-se outros, como: Prêmio Especial de Teatro Infantil, da Secretaria de Estado e Cultura, (1979); Grande Prêmio Calouste Gulbenkian de Literatura para Crianças (1986), dentre outros. Como poetisa, revela uma aguçada consciência do mundo e é a este que procura desvendar, interrogar e captar seus mistérios.

RELEVOS 
Onde o calor tortura o linho
e uma lenta erupção mastiga o tempo
lembro-me doutras coisas tantas coisas 
de que me vou esquecendo

Dodecaedro e só por dizer dode
dedo me ocorre e me socorre
dedo por dentro cheio de mistério
por fora a porta que na unha dorme

Um pisar leve de não acordar
os homens que no mundo vão dormindo
Um talher luminoso Uma cadeira
A hora mais provável do sorriso

Coritibandos não são pregos
mas podem ser mais que pisados
À noite as vozes quando saltam
provocam sinos como passos

Sua poesia acompanha de perto a prática experimentalista dos anos sessenta sem, no entanto, desprezar outras formas de estar na criação poética. Assim, obedecendo, quiçá uma sua tendência ao ecletismo, tanto deambula pelo terreno da poesia experimental, quanto se aventura por caminhos mais tradicionalistas, nos quais encontra o soneto e, nele, a forma perfeita para libertar o seu insubmisso lirismo. 

Verte rosas teu rosto vês mudado
no tempo resto de tecíveis horas
Teu sentido ou cuidado tido dado
por ti de quem não sabe como foras
Amor porquê no circo só ferência
Alguém de alguém não disse lei nem quando?
Mata-me tanta vez quanta violência

É violeta ou é letra desviolando
Luminados assombros sombras iceis
Por onde Amor? Por onde que remorsos
Nascem dos dedos harpas retangíveis?
Verte rosas teu rosto vês possíveis
um a um tuas lágrimas dos nossos
dias mal soletrados e ilegíveis 

A poesia de Maria Alberta Menéres não se constrói enquanto projeção de um estado subjetivo. Seu olhar incide sobre o que está além do seu eu social ou individual, invade as fronteiras de um imaginário transfigurador da realidade. Como outros poetas de sua geração, faz da meta-poesia um dos mais ricos momentos de reflexão poética, daí dizer: As folhas dos livros não abanam/ como as folhas das árvores/ ao sopro do meu pensamento./ E no entanto a aragem deveria ser esquiva/ e infiltrar-se por entre as palavras/ com manhas de lagarto/ estirando-se ao sol de todos os sentidos. 
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Autora: Zenóbia Collares Moreira.


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